quinta-feira, 30 de abril de 2009

Ainda sobre os porcos...

Não resisto a chamar-vos a atenção para esta crónica do Miguel Carvalho, na Visão:

«É curioso que a gripe de que se fala e que ameaça tornar-se pandémica surja num momento em que a humanidade vive a ressaca de um certo triunfo dos porcos. Gente que fez das ilusões dos seus semelhantes um chiqueiro global, com as consequências que estão à vista.
(...) Tal como o burro da fábula de Orwell, alguns sempre souberam que, cedo ou tarde, tudo seria desvirtuado ou corrompido. E a fuçanguice de uns, levou a outros à degola. Na raiz desta gripe está um sistema idêntico. No caso, a ganância sem freio das grandes indústrias de produção de carne, as mesmas que rejeitam sempre que podem - e podem muito - ser reguladas, fiscalizadas e vigiadas nos seus métodos e esquemas de produção em massa. Terreno fértil para infecção do bicho-homem.
(...) Se juntarmos a isso a pouca obstrução política aos interesses desta indústria e a aviltante postura das transnacionais do medicamento, perceberemos facilmente quem está, nesta como noutras histórias, feito ao bife

Sobre a gripe suína...

Precisamos de ser inoculados contra esta onda de pânico, escreve hoje Deborah Orr no Independent - e eu assino por baixo. Porque raio já há países, como a China e a Rússia, a proibirem a importação de carne de porco, quando o H1N1 não se transmite através da comida? No Egipto foi-se ainda mais longe, ordenando o abate de todos os porcos no país!
E porquê esta corrida às farmácias quando o Ministério da Saúde assegura que, em caso de necessidade, há uma reserva de medicamentos gratuitos para 2,5 milhões de portugueses?
É fundamental estarmos atentos e informados sobre o evoluir da situação mas é preciso não alimentar histerismos. O medo nunca foi, nunca será, um bom conselheiro.

terça-feira, 28 de abril de 2009

100 dias com Obama





Barack Obama está na Casa Branca há 100 dias e o assunto domina a capa desta semana da revista Time, com um artigo de análise de Joe Klein. Imperdível é esta galeria fotográfica, com 77 imagens de bastidores. A fotógrafa Callie Shell teve «carta branca» para acompanhar os primeiros meses de trabalho de Obama e mostra-nos momentos da vida do presidente norte-americano que, usualmente, não são do domínio público.

domingo, 26 de abril de 2009

A «rainha» de Bombaim

(Rubina (de preto), no bairro indiano de Behrampada. Foto: AFP)

Rubina tem apenas 9 anos. Alcançou a fama mundial ao participar no filme Slumdog Millionaire mas, finda a festa em Hollywood, regressou ao seu bairro de barracas, nos subúrbios de Bombaim. Este mês voltou a merecer a atenção da imprensa internacional quando um jornalista do tablóide News of the World se fez passar por intermediário de um xeque saudita, que a quereria comprar por 300 mil dólares. O pai aceitou o negócio, escreveu o jornal britânico. Mas hoje, no El Pais, Rafiq Qureshi jura que isso nunca aconteceu.

A verdade é que, como relata a jornalista espanhola Ana Gabriela Rojas, os produtores do filme prometeram pagar os estudos de Rubina, o governo indiano anunciou que lhes daria uma casa nova, a família continua a receber inúmeras propostas, mais ou menos sérias mas... nada mudou. Eles continuam a dormir no chão, numa barraca de quatro metros por quatro, numa rua onde correm esgotos a céu aberto.

Rubina parece indiferente à polémica. Continua a brincar na rua, com os amigos de sempre, mimada pelos vizinhos do bairro: «Todos me chamam Rainha.»

terça-feira, 21 de abril de 2009

Prémios Pulitzer

(Foto: Lynsey Addario / The New York Times)

O New York Times foi ontem distinguido com 5 dos 12 prémios Pulitzer, os mais prestigiados prémios de jornalismo do mundo, atribuídos pela Universidade de Colúmbia desde 1917. O júri premiou o trabalho do jornal nas categorias de Investigação, Internacional, Reportagem Fotográfica, Crítica e Notícias de Última Hora.
A cobertura «magistral e inovadora» dos «desafios políticos e militares» colocados à América nas guerras do Paquistão e do Afeganistão, mereceu o aplauso do júri, que salientou também o facto do jornal enviar equipas de jornalistas ao terreno «frequentemente», mesmo quando as condições não eram as mais favoráveis... Estas reportagens do Times foram sendo destacadas neste Blogkiosk (a última, a 6 de Abril) e são, de facto, peças raras «do melhor jornalismo internacional».
A investigação do jornalista David Barstow, Message Machine, também impressionou o júri pela forma como demonstrou a «influência» do Pentágono sobre vários generais reformados do Exército americano, «fardados» de comentadores «independentes» na rádio e televisão mas cumprindo ordens claras, defendendo apenas a postura oficial do governo sobre a Guerra do Iraque.
Com estes 5 prémios, o New York Times soma já 101 Pulitzers no currículo. O Washington Post, que no ano passado ganhou 6 prémios, venceu este ano apenas a categoria de Comentário. Mas os grandes derrotados são os meios online, considerados pela primeira vez a concurso. Só o Politico tinha artigos entre os nomeados... e não foi distinguido.
O Pulitzer mais prestigiado, o de Serviço Público, foi este ano atribuído à jornalista Alexandra Berzon, do Las Vegan Sun, pela reportagem Construction Deaths, uma «corajosa denúncia» da elevada mortalidade entre os trabalhadores da construção civil, conduzindo a mudanças legislativas e à elevação dos padrões de segurança no trabalho naquela região da América.

A lista completa das reportagens distinguidas pode ser vista aqui.

domingo, 19 de abril de 2009

Green Mind


(Ilustração: Stephen Wilkes/The New York Times)
Várias equipas de cientistas estão a tentar descobrir porque nos é tão difícil entrar em «modo verde». Quais as razões para a resistência dos nossos padrões de pensamento, dando prioridade ao «agora» e ao nosso pequeno mundo familiar, descurando o «amanhã» e a preservação do planeta? As suas descobertas poderão ser mais importantes para o combate às alterações climáticas do que qualquer avanço tecnológico. A ler, na revista de domingo do New York Times.

sábado, 18 de abril de 2009

Mais uma sexta-feira na Terra Santa

(Foto: AFP)
Ontem relembrei aqui a história de Tom Hurndall. Hoje acordei com esta notícia e depois vi este vídeo, na Al Jazeera. Sexta-feira, dia santo para judeus e muçulmanos, mais dois mortos e dezenas de feridos, na sequência da manifestação semanal de Bil'in contra o Muro de Separação, que se ergue nas terras da Cisjordânia. Testemunhas no local dizem que os manifestantes atiravam pedras aos soldados, as autoridades israelitas afirmam que um dos baleados carregava cocktails molotov e o outro entrara com uma faca no colonato de Beit El.

No sábado de manhã, um condutor palestino «mentalmente instável», segundo os relatos do Jerusalem Post, não parou no check-point de Hezmeh e atropelou dois soldados hebraicos.

Estes confrontos merecem pouco mais que um rodapé nos destaques da imprensa internacional. Afinal, é apenas mais um dia no Médio Oriente.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Por Tom, pela Paz

(Foto: The Tom Hurndall Foundation)
Tom tinha apenas 22 anos. Morreu em 2004, protegendo uma criança palestina do fogo israelita, em Rafah, perto da fronteira do Egipto. O jornalista Robert Fisk relembrou a sua vida, e a sua coragem, na sua habital coluna do Independent, a propósito do lançamento, em Inglaterra, dos diários do jovem activista (edição que terá um prefácio de Fisk).
Tom Hurndall, como contou o Guardian na semana da sua morte, era um estudante de Filosofia apaixonado pela escrita e pela fotografia. Mas era, sobretudo, um homem bom, que queria estar ao lado dos injustiçados, que queria «fazer a diferença». Antes de chegar a Gaza, tinha passado pela Jordânia, onde se juntou aos voluntários nos campos de refugiados, e pelo Iraque: ele foi um dos escudos humanos que estava em Bagdad no início do guerra, tentanto travar as bombas do «Eixo do Bem».
Robert Fisk acaba hoje por lamentar a forma como os jornalistas (ele incluído) viam estes activistas «lunáticos»:
«He was one of a bunch of "human shields" who turned up in Baghdad just before the Anglo-American invasion in 2003, the kind of folk we professional reporters make fun of. Tree huggers, that kind of thing. Now I wish I had met him (...). He was a remarkable man of remarkable principle.»
Tom fazia parte do ISM - International Solidarity Movement e, em Gaza, ajudava famílias palestinas a recuperarem as suas casas, destruídas por sucessivos ataques israelitas. A 11 de Abril de 2003, vestindo um colete laranja com a identificação da organização, estava envolvido na reparação da rede de fornecimento de água e de telecomunicações à cidade de Rafah. Um grupo de miúdos brincava perto de si e, quando os soldados israelitas começaram a disparar para o monte onde se encontravam, todos fugiram - excepto três crianças, com idades entre os 4 e os 7 anos, que ficaram petrificadas pelo medo. Tom agarrou num rapaz e levou-o para uma zona segura, voltando em seguida para resgatar uma menina. Foi imediatamente atingido com uma bala na cabeça.
Não morreu de imediato. Ficou duas horas na fronteira, à espera de autorização de Israel para ser transportado para o hospital de Be'ersheva e, daí, foi transferido para Londres, onde sobreviveu, em estado vegetativo, até 13 de Janeiro de 2004.
O soldado israelita que o matou foi acusado por «ofensa corporal grave». Segundo a organização israelita B'Tselem, mais de 500 activistas pela Paz foram mortos pelo Exército hebraico em Israel e nos territórios ocupados, desde o ano 2000.
O britânico Tom Hurndall era apenas um dos muitos cidadãos anónimos que não se resignam à ideia de que é impossível mudar o estado das coisas. Que, todos os dias, estão dispostos a dar a sua vida pelas causas em que acreditam. Já não há heróis? Não voltem a repetir essa ideia feita, por favor. Façamos aos Toms deste mundo, pelo menos, essa justiça.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Gaza, tal como eu a vi

Esta semana pediram-me para falar num colóquio, organizado pelo Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente. Falei-lhes, de coração aberto, das minhas experiências em reportagem, na Cisjordânia e em Gaza, ao longo da última década. Comigo estavam o José Manuel Rosendo (Antena 1) e a Lumena Raposo (Diário de Notícias), que tanto enriqueceram o debate, moderado pelo Carlos Almeida e pela Maria do Céu Guerra. Ficámos à conversa, na Barraca/Cinearte, até de madrugada. Era um grupo de gente interessada, informada, reivindicativa. Gente que partilha, de facto, as dores do povo palestino. Gente que (ainda) quer mudar o mundo. Foi maravilhoso.

Nessa noite, comecei por mostrar-lhes estas fotografias. Hoje apeteceu-me partilhá-las convosco. Peço desculpa pela interrupção. O melhor jornalismo internacional regressa dentro de momentos.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Bo, em exclusivo no Post

(Foto: Pete Souza/White House)
O tão falado cão de água português já chegou à Casa Branca. Ontem teve honras de primeira página no Washington Post, que se orgulha de ter revelado, em primeira mão, o nome do cachorrinho. Pois é, chama-se Bo. O «grande exclusivo» chegou a estar prometido ao New York Times mas o Post puxou dos galões, recordou Watergate. E o artigo de Manuel Roig-Franzia é muito divertido, com referências a fontes bem colocadas, como se esta fosse mesmo uma história de investigação «a sério». Como nesta passagem:


«Bo charmed the first family, a source who was there said. He sat when the girls sat, stood when the girls stood. He made no toileting errors and did not gnaw on the furniture. Bo has, after all, been receiving lessons in good behavior from the Kennedys' dog trainers. These lessons have been taking place at a secret, undisclosed location outside Washington.
Bo already has a keen sense of who's in charge. When the president walked across the room during the visit, Bo followed obediently. "He's sooooo cute," the source said, referring, let us be clear, to the puppy.»

P. S. A propósito, deliciei-me a espreitar esta Galeria de Fotos no site da revista Time: Presidents and their Dogs.

sábado, 11 de abril de 2009

Mr. Capote

Estou a reler A Sangue Frio, de Truman Capote. Não resisti a comprá-lo por 10€, numa promoção da Almedina, no Arrábida Shopping. Em casa dos meus pais havia uma edição velhinha, já amarelecida pelo tempo, com páginas ásperas e letra miudinha, que li quando era adolescente. Deve ser da idade mas cada vez mais aprecio um livro de letra grande, redonda, com entrelinhas que deixam as frases respirar. Esta reedição da Dom Quixote deu ao texto de Capote as 400 páginas que merecia - e eu agradeço.
Capote não escreveu muito mas, como estou a comprovar, permite-nos descobrir mundos novos sempre que o relemos. E para quem gosta da arte da escrita... em cada parágrafo há uma lição. Como neste texto publicado em 1957 na New Yorker: The Duke in his Domain, uma espécie de perfil de Marlon Brando, que resulta do encontro entre Capote e o actor num hotel de Quioto, no Japão, num intervalo das filmagens de Sayonara.
É raro encontrar, nas publicações actuais, textos desta dimensão. São mais de 80 mil caracteres o que, na revista onde escrevo, ocuparia 25 páginas... Impensável, dizem os gurus da comunicação dos nossos dias, defensores dos textos curtos, mastiga e deita fora, que «não maçam as pessoas». Infelizmente, digo eu. Que tenho tantas saudades de ler boas histórias que acabo a comprar livros de «não-ficção» ou a consultar arquivos dos anos 50...

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Mr. Eastwood


(Foto: Nigel Parry/Esquire)

Esta entrevista foi publicada originalmente na Esquire americana, em Dezembro de 2008. Mas eu só a descobri no número de Abril da edição inglesa, aquela que consegui comprar este fim-de-semana... Com Gran Torino ainda fresco na minha memória deliciei-me com cada ideia, com cada pedaço partilhado da sua vida, com a ironia e a sabedoria deste actor e realizador extraordinário. Li e reli, pensando que muitas destas frases poderiam ter sido ditas pelo velho ex-soldado solitário e amargo (ou agridoce?) do seu último filme. Como esta, sobre a «nossa» pussy generation...

«My father had a couple of kids at the beginning of the Depression. There was not much employment. Not much welfare. People barely got by. People were tougher then.
We live in more of a pussy generation now, where everybody's become used to saying, "Well, how do we handle it psychologically?" In those days, you just punched the bully back and duked it out. Even if the guy was older and could push you around, at least you were respected for fighting back, and you'd be left alone from then on.
(...) I don't know if I can tell you exactly when the pussy generation started. Maybe when people started asking about the meaning of life.»

segunda-feira, 6 de abril de 2009

leitura da semana II


Um país à beira da implosão. Com problemas políticos, económicos, tribais. Com guerras a ameaçar transpor as suas fronteiras e generais corruptos desejosos de fazer (mais) negócios. Os grupos talibans inflitrados nas montanhas paquistanesas ganharam ainda mais poder (e território) desde a tomada de posse do presidente Asif Zardari, que o mundo ainda conhece, sobretudo, como o viúvo de Benazir Bhutto. Reportagem de James Traub, na revista de domingo do New York Times, para compreender o que vai mal no país que Barack Obama classificou como «a região mais perigosa do mundo».

sexta-feira, 3 de abril de 2009

leitura da semana


«If you care about tigers and tamarins, rhinos and orangutans, if you believe Earth is more than just a home for 6.7 billion human beings and counting, then you should be scared. But fear shouldn't leave us paralyzed.» A ler, na Time.

london calling

( Foto: Leon Neal/AFP/Getty Images)

O comunicado final do G20 apresenta 29 medidas para recuperar a economia mundial, reformando o sistema bancário, apoiando o comércio global e prometendo novos fundos para o combate à pobreza. No Independent, o editor de Economia Sean O'Grady comenta o comunicado, ponto por ponto. Interpreta, contextualiza, aponta pontos fracos e fortes das propostas... e com uma pitada subtil de humor britânico, como se nota logo na análise do ponto 1:

1. We, the Leaders of the Group of Twenty, met in London on 2 April 2009.

Uncontroversial, though some, such as Silvio Berlusconi of Italy, would prefer policy to be run by the smaller G8 (currently chaired by Mr Berlusconi).

quinta-feira, 2 de abril de 2009

ordem e progresso

«A new world order is emerging with the foundation of a new progressive era of international cooperation»
Gordon Brown, no final da cimeira do G20

Noutras circunstâncias, diria que eram apenas palavras. Mas quando, neste ambiente de recessão, o G20 anuncia ter chegado a acordo para que o FMI venda parte das suas reservas de ouro para financiar a ajuda ao desenvolvimento dos países mais pobres... o meu coração balança entre o cepticismo e a esperança.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

G20

(Foto: Ben Stansall/AFP/Getty Images)

Na véspera da Cimeira do G20, os polícias anti-motim avançaram sobre os milhares de manifestantes que ocuparam o centro da capital britânica, depois de um grupo ter atacado a sede do Banco de Londres. Houve muitas cabeças partidas - nos dois lados do confronto.
O Guardian Unlimited é o meu site de eleição para acompanhar os acontecimentos, com uma página dedicada à Cimeira. Tem imagens em tempo real, informação actualizada ao minuto (também via Twitter), galerias de fotos e muitos artigos de opinião e enquadramento.
Vale também a pena espreitar o projecto especial G20Voice, que reune 50 bloggers de 22 países que se juntaram em Londres para participar nos protestos.