segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Gaza, dia 3

Uma família foge dos bombardeamentos em Rafah, na Faixa de Gaza
Foto: Hatem Omar/AP

Terceiro dia de guerra em Gaza. Como hoje escreve Robert Fisk no Independent, o ódio anda há tantos anos à solta no Médio Oriente que escrever sobre o assunto se assemelha cada vez mais à história da galinha e do ovo:

Yes, Hamas provoked Israel's anger, just as Israel provoked Hamas's anger, which was provoked by Israel, which was provoked by Hamas, which ... See what I mean? Hamas fires rockets at Israel, Israel bombs Hamas, Hamas fires more rockets and Israel bombs again and ... Got it?

Got it.

Entretanto, e como bem questiona Fisk, onde anda Tony Blair, o enviado do Quarteto para a Paz no Médio Oriente? Parece que nunca pôs os pés em Gaza (em 3 anos!) e, nos últimos dias, foge de jornalistas como o diabo da cruz...

domingo, 28 de dezembro de 2008

Uma nova Intifada?

Os bombardeamentos da aviação israelita prosseguiram hoje em Gaza. Desde sexta-feira terão morrido mais de 300 pessoas. Esta incursão militar, ainda sem fim à vista, é já a mais sangrenta na região desde a Guerra dos Seis Dias, em 1967. Segundo o Jerusalem Post, o governo israelita convocou hoje mais 4 500 reservistas para se juntarem às tropas estacionadas na fronteira com Gaza, indicando que uma incursão terrestre para «esmagar» o Hamas poderá avançar nos próximos dias.
Segundo o New York Times, Khaled Meshal, o líder do Hamas exilado na Síria, apelou ao início de uma nova Intifada, com ataques suicidas no coração de Israel.

sábado, 27 de dezembro de 2008

mísseis sobre Gaza

(Foto: Suhaib Salem/Reuters)
Israel lançou hoje um ataque aéreo sobre Gaza. Segundo o Guardian, os 30 mísseis lançados provocaram pelo menos 140 mortos e 250 feridos. O Hamas já jurou vingança: «Vamos continuar a resistir até à nossa última gota de sangue», disse o porta-voz do movimento fundamentalista a uma estação de rádio local.
O ataque de Israel acontece depois de dias de especulação na imprensa internacional sobre a possibilidade de uma grande ofensiva terrestre e uma semana depois do Hamas ter decretado o fim do cessar-fogo que vigorava na região há seis meses.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

boas festas

(Alemanha) Fröhliche Weihnachten und ein glückliches Neues Jahr (Bélgica) Zalige Kertfeest (Bulgária) Tchestita Koleda i Shtastliva Nova Godina (Egipto) Colo sana wintom tiebeen (Espanha) Feliz Navidad y Prospero Ano Nuevo (Esperanto) Gajan Kristnaskon & Bonan Novjaron (Finlândia) Hauskaa Joulua (França) Joyeux Noël et Bonne Année (Grécia) Kala Christougenna Ki'eftihismenos O Kenourios Chronos (Inglês) Merry Christmas and Happy New Year (Iraque) Idah Saidan Wa Sanah Jadidah (Israel) Mo'adim Lesimkha (Itália) Buon Natale e Felice Anno Nuovo (Japão) Shinnen omedeto Kurisumasu Omedeto (Latim) Pax hominibus bonae voluntatis (Noruega) Gledelig Jul (Polónia) Wesołych Świąt Bożego Narodzenia i szczęśliwego Nowego Roku (Portugal) Bom Natal e Feliz Ano Novo! (Rússia) Pozdrevlyayu s prazdnikom Rozhdestva i s Novim Godom (Suécia) God Jul och Gott Nytt År (Turquia) Noeliniz Ve Yeni Yiliniz Kutlu Olsun...

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Dispatches















É uma das melhores notícias de 2008 para quem gosta de bom jornalismo: o lançamento da revista Dispatches, imaginada pelo fotojornalista e fundador da agência VII Gary Knight e pelo jornalista e ex-director do Internacional Herald Tribune Mort Rosenblum, com o apoio financeiro do farmacêutico Simba Gill.
As suas capas simples, em papel pardo, recordam-nos que é no interior que está o essencial: os grandes ensaios fotográficos dos melhores fotógrafos da actualidade, os longos textos dos repórteres que vivem meses a fio mergulhados nos mundos que ali se revelam.
O primeiro número foi dedicado à América, em vésperas de eleições presidenciais. A segunda edição desta revista trimestral tem o Iraque como tema central.
A Dispatches nasce numa altura em que a imprensa vive uma das maiores crises da sua história mas os seus fundadores acreditam que a pior crise não é a financeira, mas a de conteúdos. Falta seriedade, profundidade, rasgo e criatividade no jornalismo dos nossos dias, sem dúvida. A Dispatches acredita que existem leitores ávidos por histórias bem contadas, saturados de informação superficial e descontextualizada, que anseiam por artigos que os façam reflectir sobre o mundo, saber mais sobre o mundo e, até, mudar a sua posição em relação ao mundo.
Os seus fundadores não têm grandes grupos editoriais a apoiá-los e, imagine-se, nem sequer procuram publicidade - a revista, com mais de 200 páginas, não terá anúncios. O preço de capa é de 15 dólares e, caso consigam 10 mil assinantes, dizem que a publicação tem o futuro assegurado (uma assinatura anual para Portugal custa 52€) . O lucro, claro, não é o que motiva esta malta: «Não somos missionários ou Dom Quixotes, somos jornalistas - tipos com consciência que querem fazer alguma coisa.»

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Ainda os sapatos e Bush...

Em tempo de crise, o Guardian dá a notícia de que uma empresa de calçado turca contratou mais 100 funcionários, para conseguir responder às encomendas... Não é uma empresa qualquer, claro. Só a Baydan Shoe Company vende sapatos iguaizinhos aos que o jornalista iraquiano Muntazar al-Zaidi atirou ao Presidente Bush.
O dono da empresa, Ramazan Baydan, não cabe em si de contente e já prometeu calçar o jornalista de borla até ao fim dos seus dias. Irá também rebaptizar aquele vulgar modelo 271 mas ainda está indeciso: deverá chamar-lhe "Bush Shoe" ou"Bye-Bye Bush"?

domingo, 21 de dezembro de 2008

10 notícias que passaram despercebidas

Na edição espanhola da Foreign Policy, 10 notícias que passaram despercebidas em 2008: da construção de um escudo anti-mísseis na Índia, com o apoio norte-americano, ao aumento da produção de cocaína na Colômbia ou a crise em Kordofán, «o novo Darfur» de quem ninguém fala.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Time elege Obama

Tal como se esperava, Barack Obama é a Personalidade do Ano da revista Time. Esta é a capa da revista que estará à venda nas bancas, a partir de amanhã: reproduz a obra do street artist Frank Shepard Fairey, um skater que viu a sua criação saltar da internet para milhões de t-shirts, cartazes, autocolantes e panfletos, durante a campanha presidencial. O cartaz que desenhou originalmente, intitulado HOPE, já tinha sido escolhido pelo mayor de Chicago para os banners que encheram a cidade, celebrando a vitória de Obama. Com a escolha da Time, a obra de Fairey conquista, em definitivo, o estatuto de imagem-ícone da campanha presidencial de 2008.

diz que é uma espécie de balanço do ano

É sempre assim no fim do ano: balanços e mais balanços. Mas a Time, que se prepara para anunciar a Personalidade de 2008 (como se ainda houvesse espaço para algum suspense...), surpreende esta semana com um número com 50 diferentes top 10 do ano. Estão lá as 10 maiores gaffes políticas, as 10 melhores ideias ecológicas, as 10 melhores fotografias, músicas, livros, filmes, séries de televisão, gadgets... e até as melhores capas de revista do ano. Eu fico dividida entre a New Yorker e a Rolling Stone... confesso que só me apetecia pendurá-las na parede de casa quando as comprei. Depois passou-me, claro.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

economia subterrânea

Um palestiniano passa uma vitela por um túnel clandestino,
na fronteira entre Gaza e o Egipto. Foto: Reuters

O posto fronteiriço de Rafah, que separa a Faixa de Gaza do Egipto, está quase sempre fechado, por imposição de Israel. As trocas comerciais tornam-se impossíveis, piorando o inferno da vida quotidiana em Gaza, que há muito se transformou numa enorme prisão a céu aberto.
Mas os palestinianos começaram a escavar túneis clandestinos, conseguindo ir ao Egipto comprar os bens essenciais que escasseiam na Faixa de Gaza, uma das regiões mais pobres do mundo. Segundo conta o El Pais, existem já mais de 1500 túneis deste género.
A segurança destas passagens secretas é mínima e os desabamentos são constantes. Este ano terão morrido soterradas cerca de 60 pessoas.
Um comerciante conta que escavar uma passagem destas demora 30 a 40 dias e custa perto de 50 mil euros. Os palestinianos «donos» dos túneis pagam ainda uma taxa de 2 000 euros ao Hamas, que governa a região. Mas o investimento compensa - há milhares de pessoas desesperadas por um pacote de farinha, uma garrafa de óleo, um litro de gasolina.

jornalista atira sapatos a Bush...

Um jornalista da televisão Al Baghdadia atirou os seus sapatos a George W. Bush durante uma conferência de imprensa, no final da visita surpresa que o Presidente dos EUA hoje fez à capital iraquiana. Atirar os sapatos é, na cultura árabe, um grande insulto.

«Vai-te embora, cão» terão sido as primeiras palavras do jornalista, quando ainda descalçava o segundo sapato... Bush ficou incomodado com o incidente mas, ao ser questionado pelos jornalistas, tentou ter piada: «Tudo o que vos posso dizer sobre os sapatos é que eram do tamanho 10».

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

da buraka para o mundo

Os Buraka Som Sistema captaram, definitivamente, a atenção da imprensa internacional. O «kuduro progressivo» da banda luso-angolana, nascida na Buraca, Amadora, merece hoje nota máxima no blogue Radar, do jornal espanhol El Mundo: «se há um som que defina o gueto, hoje em dia, tem de ser muito parecido com isto.» A propósito do lançamento do novo álbum, Black Diamond, também o britânico The Independent destacou o trabalho do grupo, na semana passada: «ao ouvi-los, só vai querer despir-se e dançar.»

domingo, 7 de dezembro de 2008

prece de domingo

O fotógrafo espanhol José Cendón e o jornalista britânico Collin Freeman continuam desaparecidos. Foram raptados a 27 de Novembro, na Somália, quando realizavam uma reportagem para o Daily Telegraph sobre os grupos de piratas que espalham o terror naquele país. Como escreve hoje Enric González no El Pais, o mundo habitou-se a não questionar o que tem à sua frente (seja no prato ou no jornal...) e esquece facilmente «o processo»: o que foi preciso para eu receber isto desta forma? Que caminhos, que desvios, que riscos, que escolhas foram feitas?
É por isso que hoje aqui deixo esta fotografia de José Cendón, captada num hospital psiquiátrico do Burundi (Prémio World Press Photo em 2006), em jeito de homenagem aos mais de 1 200 jornalistas que morreram em reportagem, na última década. Mas também em jeito de prece: que voltem a casa depressa, sãos e salvos, para nos continuarem a contar o que se passa, de facto, no mundo.

a mais bela utopia


«Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.»

Celebra-se a 10 de Dezembro o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O assunto merece destaque na revista de domingo do El Pais, que analisa os 30 artigos à luz das injustiças que ainda minam o nosso mundo... e os nossos sonhos.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

anúncios «censurados»

A Time conversou com Fred Davis, o mago da publicidade que McCain contratou para conceber os seus anúncios na campanha presidencial americana, e revela muitas das ideias que nunca foram usadas - sobretudo as que tentavam denegrir a imagem de Obama e que, ao que parece, McCain não aprovou.
Foi Davis que decidiu gozar com a aproximação de Obama às celebridades, comparando-o a Paris Hilton num anúncio polémico que, como se verificou, nada de bom trouxe a McCain. Planearam também atacar a relação do democrata com Oprah mas recuaram (a tempo..). Davis reconhece que seria um tiro no pé: «Ninguém pode, nos EUA, atacar o Pai Natal ou a Oprah».
O anúncio preferido do publicitário, e que nunca foi emitido, focava-se no tema do carácter:
'Long before the world knew of John McCain or Barack Obama, one of them spent five years in a hellhole because he refused early release to honor his fellow prisoners, while the other one wouldn't walk out of a church after 20 years of the guy spewing hatred towards America.'

O anúncio terminava com a assinatura:

'Character matters... especially when no one is listening.'

domingo, 23 de novembro de 2008

quem vê têvê...

O mundo dos media está em revolução, já sabemos. Para onde vamos, ninguém sabe. Apenas que está tudo a mudar muito, muito depressa. Fala-se muito da imprensa (é impressionante como parecem querer fazer-lhe o funeral o quanto antes...) mas e a televisão, senhores? Dei por mim a ler este número especial da revista de domingo do New York Times e a pensar que sim, esta sim, é uma revolução bem-vinda. Já não se aguenta a nossa televisão generalista, com concursos idiotas antes das notícias, telejornais que se arrastam por hora e meia (!) e telenovelas atrás de telenovelas até soarem as doze badaladas. Certo? Certo.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Clinton com Obama

Alerta do New York Times: Hillary Clinton aceitou o convite para ser a próxima Secretária de Estado norte-americana. Os últimos entraves, que estariam relacionados com os rendimentos do seu marido, o ex-Presidente Bill Clinton, foram ultrapassados. O «dream-ticket» que tantos democratas desejavam para a Casa Branca acabou, afinal, por escrever-se por linhas tortas...

Helena Almeida, destaque no El Pais

O El Pais publica hoje um artigo sobre a exposição antológica da obra da fotógrafa portuguesa Helena Almeida, a maior alguma vez realizada em Espanha. Tela rosa para vestir, em exibição nas salas da Fundação Telefónica, em Madrid, merece uma boa crítica. O estilo da autora é descrito como «pura poesia».

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Como o Afeganistão continua insane. Brutal. E como Robert Fisk nos obriga a ler mais sobre o assunto...

(Samshia, em Kandahar. Ia a caminho da escola quando talibans
lhe atiraram ácido para a cara - porque não estava coberta)

Um jornalista ocidental no Afeganistão é, por estes dias, tal como no Iraque ou na Faixa de Gaza, uma visão rara... Os directores de jornais acham que já ninguém tem paciência para ler sobre estes conflitos que se eternizam, sem solução à vista. Ainda por cima, trabalhar nestes países é escandalosamente caro e demasiado perigoso.

Felizmente, ainda há excepções. Como o jornal britânico The Independent, que mantém Robert Fisk como correspondente no Médio Oriente há mais de 30 anos e o reenviou para o Afeganistão, 5 anos depois da sua última série de reportagens no território. Hoje, publica um artigo arrepiante, depois de ter visitado o hospital de Kandahar.

Apetece fugir a cada linha, de tanto que dói ler as histórias daqueles homens e mulheres. Como a de Samshia, uma das 13 meninas que ontem foi atacada a caminho da escola. Um grupo de talibans atirou-lhes ácido para a cara, por não estarem cobertas. Ou a da jovem mulher que perdeu um pé num bombardeamento aéreo americano. Estava num casamento e apresenta-se como «uma rapariga de sorte»: os outros 36 convidados morreram.

Escusado será dizer que nesta terra, onde sobra tanto ódio, falta tudo o resto: comida, medicamentos, assistência médica.

No final, Fisk lança a pergunta: saberá Obama o que se passa realmente no Afeganistão? Ele duvida. «Se soubesse, não enviaria para cá mais 7 000 soldados, mas sim 7 000 médicos.»

P.S. Acaba de ser lançado em Portugal o último livro de Robert Fisk, A Grande Guerra pela Civilização - A Conquista do Médio Oriente (Edições 70, 44€). Os quatro primeiros capítulos do livro podem ser lidos aqui.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

«E se Obama fosse africano?»

Talvez já tenham lido este texto do escritor Mia Couto. Tem circulado por e-mail, como sempre acontece com as coisas boas que descobrimos e sentimos que temos de partilhar. Foi publicado no jornal moçambicano Savana, a 14 de Novembro. Bem hajam.
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«Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles. Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor. A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África.
Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz. Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos.
Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade. Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos. Quase todos chamavam Obama de “nosso irmão”. E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros? Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa? Tenho dúvidas. Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo.
Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: ” E se Obama fosse camaronês?”. As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano? São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto.
E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana?
1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África. Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões. E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente. Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular.
2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia.
3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes. O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos. Convenientemente “descobriram” que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado ‘ilegalmente”. Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política e assim, o regime vigente, se verá livre de um opositor.
4. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos. Em África ele é mulato. Se Obama fosse africano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto. Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério. Mas as elites predadoras fariam campanha contra alguém que designariam por um “não autêntico africano”. O mesmo irmão negro que hoje é saudado como novo Presidente americano seria vilipendiado em casa como sendo representante dos “outros”, dos de outra raça, de outra bandeira (ou de nenhuma bandeira?).
5. Se fosse africano, o nosso “irmão” teria que dar muita explicação aos moralistas de serviço quando pensasse em incluir no discurso de agradecimento o apoio que recebeu dos homossexuais. Pecado mortal para os advogados da chamada “pureza africana”. Para estes moralistas - tantas vezes no poder, tantas vezes com poder - a homossexualidade é um inaceitável vício mortal que é exterior a África e aos africanos.
6. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos países africanos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado - a vontade do povo expressa nos votos.
Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Bush em infinitas rondas negociais com mediadores africanos que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores.
Inconclusivas conclusões
Fique claro: existem excepções neste quadro generalista. Sabemos todos de que excepções estamos falando e nós mesmos moçambicanos, fomos capazes de construir uma dessas condições à parte.
Fique igualmente claro: todos estes entraves a um Obama africano não seriam impostos pelo povo, mas pelos donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos.
A verdade é que Obama não é africano. A verdade é que os africanos - as pessoas simples e os trabalhadores anónimos - festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa.
Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes. Por muito que nos custe admitir, apenas uma minoria de estados africanos conhecem ou conheceram dirigentes preocupados com o bem público.
No mesmo dia em que Obama confirmava a condição de vencedor, os noticiários internacionais abarrotavam de notícias terríveis sobre África. No mesmo dia da vitória da maioria norte-americana, África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos. Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política.
Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo.
Só há um modo verdadeiro de celebrar Obama nos países africanos: é lutar para que mais bandeiras de esperança possam nascer aqui, no nosso continente. É lutar para que Obamas africanos possam também vencer. E nós, africanos de todas as etnias e raças, vencermos com esses Obamas e celebrarmos em nossa casa aquilo que agora festejamos em casa alheia.»

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

um ano nos bastidores

Mantendo a tradição iniciada em 1984, a Newsweek acaba de publicar o seu «livro de segredos» das eleições presidenciais. Durante um ano, uma equipa de jornalistas da revista teve acesso especial e (quase) ilimitado aos candidatos, garantindo aos partidos que nada do que vissem ou ouvissem seria publicado antes do dia das eleições. Os sete capítulos desta reportagem especial estão disponíveis online, acompanhados por vídeos em que os jornalistas contam várias histórias dos bastidores. Um documento histórico.

domingo, 16 de novembro de 2008

histórias do outro mundo

(Foto: João Pina/El Pais)

Daniela Cott tem 16 anos. Cresceu num bairro pobre dos arredores de Buenos Aires e sobrevivia revolvendo o lixo, em busca de garrafas, latas ou pedaços de cartão. No ano passado, uma designer argentina reparou nela, enquanto revolvia um contentor. Achou-a alta, esguia, bonita. Num abrir e fechar de olhos, estava inscrita no concurso Elite Model Look. Ganhou.
Uma história incrível para ler na revista de domingo do El Pais, com um motivo extra para nos deslumbramos (e orgulharmos): as fotografias do «nosso» João Pina.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Agora

É um prazer que, infelizmente, só está acessível de dois em dois meses. Mas tal como recomenda o artigo de capa desta edição da Psychology Today, vou deixar-me de lamúrias e aproveitar este momento, o agora, em que posso ler os seus artigos. É extraordinária a forma como a redacção da Psy consegue falar dos temas mais sérios, numa área tão dada a depressões como pode ser a psicologia, de uma forma bem-humorada. Acabo sempre de ler esta revista com um sorriso nos lábios, determinada a mudar a minha vida (ainda que não passe de uma ilusão...).
Gosto especialmente do início do texto, quando no meio do deserto do Nevada, durante um festival de música (Burning Man), um tipo depara com uma cabine telefónica que anuncia «Talk to God». Ele pega no telefone, claro. E pergunta a Deus (ou a quem quer que seja que responde do outro lado) como acalmar a torrente de preocupações que assaltam constantemente os seus pensamentos e aproveitar mais cada momento da sua vida. «Just breathe». Às vezes, é mesmo o que basta. Mas há mais para ler neste artigo, uma profunda inspiração...

sábado, 8 de novembro de 2008

«O êxito condenou-me à morte»

Roberto Saviano, fotografado ontem, em Sevilha (Foto: JORDI SOCÍAS/El Pais)

Já aqui tinha falado de Roberto Saviano, o jornalista italiano que escreveu um livro-reportagem sobre a máfia napolitana, depois adaptado ao cinema com enorme sucesso (o filme Gomorra ainda está em exibição no cinema Nimas, em Lisboa). A máfia prometeu matá-lo e Saviano vive agora em local incerto, sempre vigiado de perto por quatro polícias especiais que o governo italiano destacou para o proteger. Tem 29 anos e «toda a tristeza do mundo no seu olhar», como escreve hoje o El Pais, que o entrevistou em Sevilha. Apesar das ameaças, fez questão de ir a Espanha promover o «seu» filme. E continua a trabalhar, apesar da paranóia securitária que amordaça todos os momentos da sua vida: «Escrever é resistir».

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

leitura da semana

«Some princes are born in palaces. Some are born in mangers. But a few are born in the imagination, out of scraps of history and hope. Barack Obama never talks about how people see him: I'm not the one making history, he said every chance he got. You are. Yet as he looked out Tuesday night through the bulletproof glass, in a park named for a Civil War general, he had to see the truth on people's faces. We are the ones we've been waiting for, he liked to say, but people were waiting for him, waiting for someone to finish what a King began.»
Mais um extraordinário texto de Nancy Gibbs, na Time, quando já tudo parecia ter sido escrito...

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

terça-feira, 4 de novembro de 2008

guia para a noite eleitoral

Muitos portugueses preparam-se para uma noite longa, em frente à televisão ou ao ecrã do seu computador (ou dos dois, ao mesmo tempo). Eis as 5 informações a que vale a pena estar atento (para mais «dicas» para navegar nesta torrente de informação, vejam o guia eleitoral do New York Times):

1. São precisos 270 votos eleitorais para ser eleito. As percentagens nacionais não têm muita importância (Se bem se recordam, Gore teve mais votos que Bush mas perdeu, ainda assim)

2. Às 23h, hora de Lisboa, fecham as urnas no Indiana e Kentucky. Se Obama ganhar no Indiana, um estado tradicionalmente republicano mas empatado nas últimas sondagens, será um sinal positivo para o democrata.

3. Virginia, Virginia, Virginia. Meia-noite. Se Obama ganhar aqui, é quase seguro que será o próximo Presidente. À mesma hora, os resultados do New Hampshire, que devem favorecer McCain. Se assim não for... já perceberam.

4. Também à meia-noite, olhem para a Florida, destinada a ser o centro das atenções em todas as corridas presidenciais. De tendência republicana, se McCain perder os votos deste estado, o 4º mais importante do país, é quase seguro que podemos todos ir dormir.

5. Segue-se a Carolina do Norte e o Ohio. 1h da manhã. A esta hora todas as televisões norte-americanas prevêm avançar o nome do próximo Presidente, com base em sondagens nacionais à boca das urnas (apesar das últimas só fecharem às 4h da manhã). Podem ir acompanhando aqui todas as sondagens em tempo real.

momento musical

Hoje a objectividade fica na gaveta. Tenho ao peito um pin azul, onde se lê «Yes, we can». Comprei-o em Washington, quando a corrida deste homem ainda não passava de um sonho. Today is the day. E é com essa certeza (e essa alegria) que vou passar o dia a trautear esta canção.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

momento multimédia

Muito se fala de multimédia nas redacções deste país. Mas estamos na idade da pedra, é o que vos digo. Ora vejam lá este balanço de campanha do New York Times.

One Day to Change the World

contagem decrescente III

Já se escreveu tanto sobre as eleições americanas que a missão de publicar alguma coisa original e interessante sobre os candidatos parece quase impossível... Mas a edição especial do New York Times sobre as Eleições de 2008 surpreende e oferece a mais-valia de encontrar num só local muita informação interessante sobre o percurso e as ideias de cada um (e dos seus vices também). Vale sobretudo a pena ler os textos principais sobre Obama (Forever Sizing Up) e McCain (Flexible Aggression), que remetem depois para os artigos mais significativos já publicados noutras edições do jornal.

domingo, 2 de novembro de 2008

contagem decrescente II












Depois de 109 caucus e eleições primárias, 47 debates e 5 mil milhões de dólares gastos ao longo de 933 dias de campanha, a maratona para a eleição do novo Presidente dos EUA está prestes a chegar ao fim. As sondagens continuam a dar vantagem a Obama (hoje com uma média de 6,3%) mas os milhões de voluntários democratas que se empenharam nesta eleição histórica estão longe de querer cantar vitória, como se percebe neste artigo do New York Times.
Nalguns Estados a diferença entre os candidatos é tão pequena que, de facto, ainda tudo pode acontecer. São este swing states que mais preocupam os candidatos e fascinam os jornalistas, a dois dias das eleições.

sábado, 1 de novembro de 2008

contagem decrescente

«Eles apenas aparentam pertencer à nossa galáxia. Na verdade, o homem que será Presidente tem vivido, nos últimos meses, num universo paralelo, um local onde o líder executivo muda as leis com um aceno e reorganiza a sociedade com um único rabisco.» Esse é o mundo das promessas eleitorais. Mas o que mudará mesmo nos EUA (e no mundo) quando um destes homens ocupar a Sala Oval da Casa Branca? É o que antecipa a Time, na última edição antes das eleições de 4 de Novembro.
Vale também a pena espreitar uma das raras entrevistas de David Axelrod, o estratega da campanha de Obama e «pai» do slogan Yes, we can. A sua única preocupação, diz, é a abstenção. Se as pessoas forem votar massivamente, ele acredita que o democrata terá a vitória assegurada. De qualquer forma, está a escrever dois discursos para Obama ler na noite de 4 de Novembro... «Terão sempre um espírito positivo, independentemente dos resultados», revela. Porque mesmo no pior dos cenários (a vitória de McCain), haverá muito que celebrar. Esta foi uma corrida histórica e a «Obamania» deixará sempre marcas - e sementes. Mas, como indica o seu sorriso nestes últimos dias (ele, que surgia sempre sisudo em público), Axelrod está seguro de que, na próxima terça-feira, terá razões para festejar em grande.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

uma nova Atlantic

A Atlantic de Novembro já chegou às bancas, e de cara lavada. Em 151 anos de história, esta é a 8ª vez que o seu grafismo é alterado e a direcção da revista aproveitou o momento para modificar algumas secções, como explica o director James Bennet (sobre o novo design, aqui ficam as notas do director gráfico, a quem interessar).
Essas mudanças impunham-se num novo mundo, nestes tempos estranhos que vivemos:
in these days of Chinese momentum and American uncertainty, of warming seas and Twittered lives, of handheld miracles, pious killers, oracular genetics, and reborn political passions
E a Atlantic quis mudar para dar mais aos seus leitores:
a magazine about ideas that matter can be useful to those who want to understand what’s happening, and maybe to do something about it
Apoiado.
Ficarei atenta aos próximos números. Nesta edição, gostei especialmente do tema principal da capa, Devem as mulheres governar o mundo?, um exercício divertido que a jornalista Sandra Tsing Loh fez a partir do controverso livro que Dee Dee Myers, a assessora de imprensa do presidente Bill Clinton, agora publicou nos EUA. E este texto sobre a China vale mesmo a pena. Carlos, tu vais gostar especialmente, tenho a certeza.

domingo, 26 de outubro de 2008

nascida para salvar

Esther González com Izel ao colo, que nasceu para salvar a sua outra filha, Erine.
Foto: SUSANNA SÁEZ/El Pais
No El Pais de hoje é difícil ficar indiferente às histórias de quatro famílias que recorreram à ajuda da genética para salvar um filho doente. Apesar da lei espanhola da reprodução medicamente assistida prever desde 2006 a possibilidade da concepção in vitro para a selecção de embriões compatíveis com os seus irmãos (o que cá não é possível, em nome do «respeito à vida»), estas famílias dizem que a legislação não é eficaz e acabaram por recorrer ao estrangeiro (Bélgica, Reino Unido e EUA, por exempo).
«Salvei uma vida e criei outra», diz Esther, que não entende a polémica criada em torno deste assunto. Concebeu Izel para salvar Erine, de 4 anos, que agonizava com uma leucemia e não encontrava um dador de medula óssea compatível. As células estaminais do cordão umbilical da irmã salvaram-lhe a vida.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Saramago na New Yorker

A revista New Yorker publica na edição desta semana uma crítica ao último livro de José Saramago publicado nos Estados Unidos, Death with Interruptions (As Intermitências da Morte, ed. Caminho, 2005). São perto de 3 mil palavras, 16 500 caracteres, quase 5 páginas A4 de crítica - desculpem o meu assombro mas, por cá, ninguém dá este espaço a um livro, até porque a crítica, a boa crítica às artes que tanta falta faz nos nossos jornais, está em vias de extinção. Adiante. A narrativa de Saramago, escreve James Wood, soa «moderna e antiga ao mesmo tempo». E é o seu estilo único que lhe permite «escrever ficções especulativas e fantásticas como se fossem os acontecimentos mais prováveis». Como será ler Saramago em inglês?, dei por mim a pensar. Percebo por esta crítica que os seus parágrafos longos se mantêm, que os pontos finais e as vírgulas não deixam de obedecer a regras próprias. Deixo-vos um excerto (uma única frase...), para matarem a curiosidade:

«Having lived, until those days of confusion, in what they had imagined to be the best of all possible and probable worlds, they were discovering, with delight, that the best, the absolute best, was happening right now, right there, at the door of their house, a unique and marvelous life without the daily fear of parca’s creaking scissors, immortality in the land that gave us our being, safe from any metaphysical awkwardnesses and free to everyone, with no sealed orders to open at the hour of our death, announcing at that crossroads where dear companions in this vale of tears known as earth were forced to part and set off for their different destinations in the next world, you to paradise, you to purgatory, you down to hell.»

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Obama e a avó

Obama interrompeu a campanha eleitoral para ir ao Havai visitar a avó, gravemente doente, como conta a revista Time. Faltam duas semanas para as eleições e, apesar da vantagem que as sondagens lhe garantem, a vitória não é segura. Durante dois dias, os seus rivais terão o espaço mediático por sua conta, o que pode ser arriscado. Obama sabe disso mas escolheu fazer esta viagem, sem jornalistas por perto. No seu livro A Minha Herança (editado em português pela Casa das Letras) conta que o maior erro da sua vida foi não ter estado ao lado da mãe quando ela morreu, vítima de cancro. Obama estava em campanha para o Senado e chegou à cabeceira da sua cama tarde demais. Filho de mãe solteira (o pai, com quem nunca teve uma relação próxima, morreu num acidente de carro no Quénia, em 1982), foi esta avó materna que o criou e que, com grandes sacrifícios pessoais, permitiu que ele estudasse e se tornasse no homem que é hoje. Madelyn Dunham tem 86 anos e seguiu a campanha do neto com especial emoção. Esperemos que viva para ver a sua vitória, a 4 de Novembro.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

ficção e realidade

Três actores do filme Gomorra, que retrata a brutalidade da máfia napolitana**, foram presos e estão a ser investigados por pertencerem, de facto, aquela organização criminosa, conta o Guardian. Roberto Saviano, o autor do livro que inspirou o filme (Gomorra já vendeu mais de um milhão de livros em Itália e o filme, depois de premiado em Cannes, é o candidato italiano ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro), viveu os últimos dois anos sob forte protecção policial mas agora, face à escalada das ameaças do clã Casalesi (as últimas prometiam-lhe a morte como presente de Natal), diz que já não aguenta mais viver em Itália. Na quinta-feira passada anunciou que vai sair do país, sem revelar, obviamente, onde buscará refúgio: «Quero poder andar na rua, disfrutar do sol, passear à chuva, apaixonar-me, ter uma vida.»

** No mês passado, quando o filme estreou em Portugal, o Público descreveu-o assim: «É um mergulho brutal e violento nos meandros dos círculos infernais da Camorra napolitana, com uma crua e incrível precisão. Poder, dinheiro e sangue são os "valores" com que os habitantes de Nápoles se confrontam diariamente. A única linguagem é a das armas e o sangue o vício maior. Viver uma vida normal não é possível para estes habitantes. (...) Uma Camorra ficcionada mas profundamente enraizada na realidade italiana.» O filme (ainda) está em exibição no cinema Nimas, em Lisboa.

domingo, 19 de outubro de 2008

Powell apoia Obama

O ex-Secretário de Estado norte-americano Colin Powell (2001-2005, com Bush) tornou hoje público o seu apoio a Barack Obama no programa da MSNBC «Meet the Press». John McCain, Sarah Palin e o (seu) partido Republicano são duramente criticados, sobretudo pela «campanha agressiva» das últimas semanas. Powell disse lamentar que membros do seu partido ponham a circular rumores falsos sobre as ligações terroristas de Obama ou sobre a sua fé. «Quando alguém insinua que 'Ele é muçulmano', há que corrigir: 'ele é cristão, sempre foi cristão'. Mas a resposta verdadeiramente correcta seria: 'E se for muçulmano, qual é o problema?' A guerra política não pode justificar tudo, tem de haver alguma decência e acho que a campanha de McCain foi longe demais».

sábado, 18 de outubro de 2008

Jornais apoiam Obama

Três dos mais importantes e influentes jornais norte-americanos anunciaram hoje o seu apoio formal a Barack Obama. O Washington Post explica o apoio fazendo notar que a escolha se tornou mais fácil depois da «desapontante campanha» de McCain e da «escolha irresponsável» de Sarah Palin para sua vice-presidente. O Los Angeles Times diz que Obama «é um líder competente e confiante, que representa as aspirações da nação». Razões que levaram o jornal a quebrar um silêncio de mais de 35 anos: o diário não apoiava publicamente nenhum candidato à Presidência desde a eleição de Richard Nixon. O Chicago Tribune faz história de outra forma, apoiando pela primeira vez um candidato democrata: «Temos absoluta confiança no seu rigor intelectual, nos seus valores morais e na sua habilidade para tomar decisões justas e ponderadas.»

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

o factor t

Poderá a personalidade e o temperamento dos candidatos à presidência ser crucial para a escolha dos americanos? Vários analistas dizem que é «o» factor decisivo... E, neste momento, as sondagens dizem que a maioria dos americanos considera que Obama é mais «presidenciável»: é calmo, ponderado e parece saber discutir sem se exaltar. Além disso, tem um sorriso contagiante, que tem usado com mestria, mesmo nos momentos mais adversos.
Chegará? Russell Riley, especialista do Miller Center of Public Affairs, não responde a esta questão mas explicou à Time quais seriam os «ingredientes» ideiais de um futuro presidente: «A decência de Gerald Ford, a disciplina de Jimmy Carter, o optimismo de Ronald Reagan, o instinto diplomático de George H.W. Bush, a curiosidade intelectual de Bill Clinton e a determinação de George W. Bush.»

terça-feira, 14 de outubro de 2008

ah, tigre!

Aravind Adiga venceu hoje o Man Booker Prize, o mais importante prémio literário em língua inglesa, com o seu primeiro romance, White Tiger. Adiga vive em Bombaim, tem 33 anos e é (foi?) jornalista, colaborando com a revista Time e vários jornais diários ingleses. Como conta o Guardian, a atribuição deste prémio é uma surpresa: a aventura indiana de «Tigre Branco» impôs-se numa short list de peso (ao lado de Sebastian Barry, Amitav Ghosh, Linda Grant, Philip Hensher e Steve Toltz), que já deixava para trás nomes consagrados como Salman Rushdie...

Aqui fica um excerto do livro vencedor:

«Now, I no longer watch Hindi films - on principle - but back in the days when I used to, just before the movie got started, either the number 786 would flash against the black screen - the Muslims think this is a magic number that represents their god - or else you would see the picture of a woman in a white sari with gold sovereigns dripping down to her feet, which is the goddess Lakhshmi, of the Hindus.
It is an ancient and venerated custom of people in my country to start a story by praying to a Higher Power. I guess, Your Excellency, that I too should start off by kissing some god's arse.
Which god's arse, though? There are so many choices.
See the Muslims have one god. The Christians have three gods. And we Hindus have 36,000,000 gods.
Making a grand total of 36,000,004 divine arses for me to choose from.
Now there are some, and I don't just mean Communists like you, but thinking men of all political parties, who think that not many of these gods actually exist.
Some believe that none of them exist. There's just us and an ocean of darkness around us. I'm no philosopher or poet, how would I know the truth? It's true that all these gods seem to do awfully little work - much like our politicians - and yet keep winning re-election to their golden thrones in heaven, year after year.»

domingo, 12 de outubro de 2008

O outro McCain

Mentiroso. Desonesto. Oportunista. Estes são alguns dos mimos com que a Rolling Stone descreve o candidato presidencial John McCain num longo artigo de investigação, recuperando inúmeras histórias «sujas» do seu passado. Faltam três semanas para as eleições...

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

todos iguais?

Previsivelmente, o casamento entre pessoas do mesmo sexo foi hoje chumbado no Parlamento português. No mesmo dia em que, do outro lado do Atlântico, esse «contrato de amor» passou a ser permitido em mais um Estado norte-americano, o de Connecticut. Tal como conta o New York Times, o Supremo Tribunal entendeu que «o Estado não tem como justificar porque exclui da instituição do casamento os casais do mesmo sexo».
Claro. Lá, como cá, é ofensivo para uma sociedade que se reclama democrática e respeitadora dos direitos individuais dos seus cidadãos. E é inconstitucional. Mas isso, como se nota pelo ar enfadonho que põem os nossos políticos sempre que se fala no assunto, não interessa nada.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

leitura da semana

Fala-se muito de como esta é a maior crise mundial desde a Grande Depressão. Mas o que aconteceu então? Como saiu o mundo dessa crise? O que pode a História ensinar-nos? Um texto simples, curto, esclarecedor, The End of Prosperity?, explica tudo. A ler, nesta edição da Time.

And the winner is... That One!

Quando McCain se referiu a Obama usando a expressão «that one» não pensaria, de certeza, que a sua má educação estaria, no dia seguinte, imortalizada em t-shirts de campanha... Já há um site dedicado ao tema, onde a biografia de Obama é adaptada ao momento da campanha: a ler em http://www.thatone08.com/. E até o influente jornal online The Huffington Post, numa nota de bom humor, decidiu abraçar o movimento dizendo que o vencedor do debate de ontem foi... é claro, That One!

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

NY state of mind...



O New York Times publicou o seu Suplemento de Moda Masculina/Outono 2008. Bom, por cá talvez fosse mais um daqueles «encartes» que ia direitinho para a reciclagem... Mas o NYT publica sempre revistas que apetecem guardar, como já devem ter percebido pelas vezes que as destaco neste blog...! Infelizmente, não chegam cá em papel. Valha-nos a Santa Internet, que nos deixa ver estas páginas maravilhosas.
A capa começa logo por agarrar-nos. E lá dentro, descobrimos Javier Bardem, chorando. A legenda dirá que veste um casaco Tom Ford, mas... who cares? A acompanhar as belas fotos de Jean-Baptiste Mondino, há ainda uma interessante entrevista de Lynn Hirschberg, às voltas com a participação do espanhol no novo filme de Woody Allen, Vicky Cristina Barcelona.
A revista revela-nos muito mais do que as tendências da moda. Fala-nos de arte, de política, de música e até de publicações novas, como a Tar, um tesouro bi-anual que vou querer comprar assim que aterrar outra vez em Nova Iorque. Enquanto isso não acontece, é bom poder matar saudades folheando estas páginas...

terça-feira, 30 de setembro de 2008

700 mil milhões...

Perante o chumbo da proposta de Paulson (secretário de Estado do Tesouro de Bush) na Câmara dos Representantes, já se fala num «11 de Setembro económico».... Para melhor perceber o que está em causa, vale a pena ler o artigo de capa da Economist (publicado ainda antes do chumbo político) e os outros que se lhe seguiram, na edição online.

sábado, 27 de setembro de 2008

Factos, factos, factos!

A verificação é um dos pilares nobres do jornalismo. Por cá pratica-se pouco e é pena. Nos Estados Unidos, o fact-checker é um elemento imprescindível nas redacções (certo, também pelo receio que os directores têm de processos judiciais...), chegando ao ponto de contactar todas as fontes citadas pelo jornalista que assina a peça. «É verdade que se encontrou com fulano x no local y, no dia w, e o conteúdo da vossa conversa foi z? No artigo ele cita-o da seguinte forma... considera correcto?»
Este tipo de trabalho pode ser discutível (na minha opinião, o jornalista tem de ser responsável pela informação que publica e a direcção, à partida, deve confiar, e não desconfiar, do trabalho dos seus repórteres). Mas na cobertura do jornalismo político, a verificação assume uma importância especial, que muito me agrada. Regra geral, os leitores gostam que os jornalistas os iluminem a este respeito: afinal, Obama disse ou não aquilo há três meses? E McCain votou ou não daquela forma há 20 anos?
Em Washington tive a felicidade de ter aulas com Brooks Jackson, jornalista veterano que durante 34 anos acompanhou o mundo político americano para a Associated Press, Wall Street Journal e CNN e é hoje director de um site imprescindível, o FactCheck.org. O lema do trabalho que ali se publica diariamente é claro: holding politicians accountable. Em dia de rescaldo, depois do primeiro debate entre Obama e McCain, vale a pena ver o que se escreve por lá...
O Washington Post, no seu blog The Fact Checker, também acompanhou em tempo real as intervenções dos candidatos, esclarecendo a veracidade da informação. Verdadeiro serviço público, é o que vos digo.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

20 anos de Al Qaeda

A edição desta semana da Economist publica um artigo sobre a globalização da Al Qaeda, fundada há 20 anos. Muito interessante, sobretudo na análise da importância das novas tecnologias para o movimento terrorista. Mas o melhor texto do ano sobre este assunto foi publicado na New Yorker de Junho, da autoria do jornalista Lawrence Wright, o mesmo que ganhou o Prémio Pulitzer em 2006 com o livro The Looming Tower: Al-Qaeda and the Road to 9/11. Uma investigação rigorosa, com reportagem em vários locais do mundo, que se lê avidamente, ao estilo dos melhores policiais.

domingo, 14 de setembro de 2008

palin-tolo-gia


Quem é esta mulher do Alasca que, de repente, John McCain atirou para a ribalta mundial, ao convidá-la para candidata a vice-presidente dos EUA? A imprensa norte-americana tem-se esforçado em traçar o seu perfil, desenterrando as histórias mais inacreditáveis sobre o seu passado. Na semana passada, a Time descrevia-a desta forma: «Palin é uma rainha de beleza tornada comentadora desportiva e feita governadora. Uma activista anticorrupção numa capital estadual ensopada de petróleo e de escândalos. Uma caçadora de caribus que também revela a sua feminilidade em fotografias de moda. Uma evangélica com ombros largos e ambições mundiais.»
A Newsweek baptiza-a, neste artigo, como «A apóstola do Alasca», numa referência às suas conservadoras convicções religiosas. E revela que, no início do ano, quando questionada pelos jornalistas da revista sobre quem seria o seu candidato preferido para a Presidência, disse não haver ninguém que a entusiasmasse - e McCain seria a última das suas escolhas...

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

9/11

Sete anos depois, ainda há apenas um espaço vazio no lugar das Torres Gémeas. Bin Laden continua em parte incerta. Intensificam-se as guerras no Iraque e no Afeganistão. A Al Qaeda estende os seus tentáculos por todo o mundo. E o medo continua à solta.
Todos sabemos exactamente onde estávamos e o que fazíamos naquele dia, naquele momento em que o mundo mudou. Hoje, ao ler este especial do New York Times, recordei esses momentos. Num dia de luto mundial, resta-me esperar, em jeito de prece, que nunca mais tenhamos que viver um dia tão negro. Que, tal como hoje simbolicamente aconteceu em Nova Iorque, a luz possa vencer as trevas.